Realizando uma análise sociológica acerca das estruturas jurídicas internas de certa favela do Rio de Janeiro, com a denominação fictícia de Pasárgada, Boaventura de Sousa Santos verificou a existência de uma nítida pluralidade normativa no espaço territorial da mencionada favela. Por meio de um estudo minucioso a respeito da história jurídico-social de Pasárgada, o referido autor constatou nessa favela a presença de duas ordens jurídicas visivelmente distintas: o direito oficial brasileiro e um direito “não-oficial”, que surgiu a partir de regras de conduta estipuladas e seguidas, de forma tácita ou explícita, pelos habitantes da favela. Inicialmente, Boaventura de Sousa realizou um estudo histórico sobre a gênese social de Pasárgada, nome dado a uma comunidade carente do Rio de Janeiro, a fim de obter dados referentes à origem e às características preponderantes de uma complexa duplicidade jurídica que ali se estabeleceu. Desse modo, o autor procurou empreender um panorama histórico em relação ao contínuo crescimento da referida favela, com ênfase no estudo dos conflitos sociais que nela foram identificados. Segundo o autor, tais conflitos eram praticamente inexistentes nos primórdios da formação de Pasárgada, em meados da década de 1930, quando havia bastante terra disponível no povoado e cada um podia construir sua habitação, sem necessidade de confrontos sérios com os demais moradores . No entanto, o rápido crescimento de Pasárgada propiciou uma certa intensificação dos conflitos que, na segunda metade da década de 1940, já eram muito freqüentes entre os habitantes daquela região. Esses litígios envolviam principalmente posse de terra e foram sendo resolvidos por meio da “lei do mais forte”, ou seja, mediante o uso efetivo da violência. Em virtude de diversos empecilhos ao acesso dos mecanismos oficiais de ordenação e controle social, como a polícia e os tribunais, os habitantes de Pasárgada passaram a tentar resolver seus