ética democrática e seus inimigos
Jurandir Freire Costa2
Em geral, quando falamos de violência, pensamos em uso da força, com vistas à exclusão de grupos ou indivíduos de uma dada situação de poder. Essa violência pode ou não encontrar resistência na violência dos excluídos. Como quer que seja, nos dois casos estão em jogo os princípios axiológicos que permitem arbitrar o que é legal ou ilegal, legítimo ou ilegítimo, na interação entre os humanos. O ponto central desta leitura, portanto, é a noção de abuso de poder, de invasão desestruturante de uma ordem desejável, posta no horizonte ético da cultura.
Os estudos que se detêm neste aspecto da violência, são, por certo, importantíssimos. Normalmente analisam as relações de poder entre grupos ou classes e focalizam, especialmente, as ações individuais ou coletivas que buscam anular a força do adversário, na defesa de seus respectivos pleitos sociais.
No Brasil, os trabalhos que denunciam a exploração econômica dos trabalhadores, a concentração de renda, as brutalidades cometidas contra etnias indígenas, as matanças de delinqüentes ou menores infratores, a epidemia de assaltos, seqüestros e roubos exemplificam o gênero de reflexão ao qual nos referimos.
Numa direção diferente, penso em abordar a violência a partir da visão que o indivíduo de elite tem de seu destino sócio-individual. A escolha deste ponto de vista deve-se a duas razões principais. A primeira concerne ao poder que tem tal indivíduo de formar mentalidades. As elites brasileiras monopolizam a maior parte das riquezas materiais do país e os instrumentos que consagram normas de comportamentos e aspirações como recomendáveis e desejáveis. Seu valor estratégico, no que concerne à mudanças sociais, é, por este motivo, de grande importância.
A segunda razão diz respeito à possibilidade de entender mais facilmente "como e em que pensam as elites", dado o hábito cultural que têm de tematizarem a si mesmas.