Faoro - Os donos do poder
"O poder - a soberania nominalmente popular - tem donos que não emanam da nação, da sociedade, da plebe ignara e pobre. O chefe não é um delegado, mas um gestor de negócios, gestor de negócios e não mandatário. (...). E o povo, (...) que quer ele? Este oscila entre o parasitismo, a mobilização das passeatas (...). A lei, retórica e elegante, não o interessa. A eleição, mesmo formalmente livre, lhe reserva a escolha entre opções que ele não formulou."
Este retrato permanece atual, demonstrando que uma das principais teses do livro: "a persistência secular da estrutura patrimonial" do Estado brasileiro mantém-se, em sua essência, inalterado. Se isso é suficiente para evidenciar o caráter clássico de "Os Donos do Poder", por outro lado convém assinalar que o livro teve um percurso estranho, pensando em termos de um clássico brasileiro que transita pela história, política e sociologia.
Passando em branco
"Raízes do Brasil" (1936) ou "Casa Grande e Senzala" (1933), de Sérgio Buarque de Hollanda e Gilberto Freyre, respectivamente, acabaram tendo boa recepção logo após suas publicações.
O livro de Faoro acabou quase passando em branco quando foi publicado, em 1958, ano de enorme euforia econômica (em pleno quinquênio juscelinista) e da conquista da primeira Copa do Mundo de futebol, disputada na Suécia.
Naqueles anos dourados pouco se falava em matéria de permanência histórica, da inexistência da mudança política, um dos pilares do livro, mas a tônica era a modernização, a reforma e, para alguns, a revolução.
O mundo da época
No ano seguinte os guerrilheiros do Movimento 26 de julho tomariam o poder em Cuba; na Argélia, a guerra de libertação tinha levado à queda da 4ª. República francesa - metrópole colonial - e a ascensão à presidência da República do general Charles de Gaulle.