Deleuze
A Nomadologia de Deleuze-Guattari
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Paulo Domenech Oneto
O capítulo ou “platô” 12 do livro Mil Platôs, de Gilles Deleuze e Félix
Guattari – publicado em 1980 como segunda parte de Capitalismo e Esquizofrenia (dando seqüência a O Anti-Édipo, de nove anos antes) – é intitulado “Tratado de Nomadologia: a máquina de guerra”. A exemplo dos demais “platôs” que compõem a obra, esse título é precedido por um número, que nada tem a ver com a numeração por capítulos. Trata-se de um ano ou período histórico, ao qual cada um dos temas abordados no livro está direta ou indiretamente relacionado. No caso desse “tratado”, cujo título é, a um só tempo, uma referência aos nômades e um jogo de palavras com a monadologia leibniziana, o número é 1227. Mas que estranha data é essa? E de que trata exatamente o capítulo em questão?
O ano é a data da morte de Gengis Khan, cujo nome real era Temujin e que se tornou chefe (khan) dos guerreiros mongóis naquele distante século XIII. Temujin teve infância difícil, mas foi hábil o bastante para se tornar “chefe universal” de tribos nômades de toda a Ásia, formadas por povos de etnias diferentes, levando-os a ocupar uma área que se estendia de Pequim (China) até a região do Volga (Rússia). Apesar dos relatos de crueldade que ilustram a ação de Gengis Khan, foi essa dominação que garantiu um período de paz para os povos turcos e mongóis (entre outros), ao abrir espaço para que eles pudessem circular sem a ameaça de serem dizimados ou simplesmente incorporados aos reinados vizinhos.
A questão mais importante do capítulo gira precisamente em torno desse tipo de ação nômade que, como o segundo axioma do tratado proposto irá deixar claro, é distinta da ação de uma instituição militar. Gengis Khan torna-se, assim, um nome emblemático em meio à argumentação geral de Deleuze-Guattari (ou
Deleuze e Guattari para os amantes da individuação), e isto na medida em que, nesse personagem