Autonomia da vontade
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M AR I A ANG É L I C A BE NE T T I AR AÚJ O 1 “ Há dua s tr a gédia s na vida . Uma é nã o conseguir o que deseja seu cor a çã o. A outr a é conseguir .”
(Ber na r d Sha w)
1. A von t a d e com o fu n d a m en t o essen cia l d o Dir eit o
Franceses dos séculos XIII e XIV, como Etienne Dolet, propugnavam o determinismo inflexível, a impotência do homem e a rigidez do destino. A vontade era, pois, aquilo que “nos causa e afasta tudo o que chamamos bem e mal. E essas duas coisas, os humanos as recebem por um infalível desejo de Deus [...] porque nada mais é que uma ordem eterna das coisas”. Os filósofos do século XVI, como o italiano Fregoso, autor de
“Diálogo de Fortuna” (1521), diante de tão irracional resignação, conceberam uma vontade cuja “mão esquerda segura um freio e rédeas para reprimir os excessos, e sua direita uma
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copa para recompensar os justos” .
Ao longo da história, a liberdade transmudouse do espaço coletivo para o individual. Até então sinônimo de livrearbítrio justo para a esperada recompensa divina, a autonomia ganha feição dogmática, vindo a significar o espaço de autoregulação dos interesses privados, de onde emerge o contrato.
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Advogada; Professora contratada da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(UERJ); Assistente de Ensino do Curso de Extensão em Direito dos Contratos da Fundação Getúlio Vargas
(FGV); Reponsável pela análise e desenvolvimento acadêmico do Programa de Educação Continuada da
Escola de Direito do Rio de Janeiro da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
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Estas citações foram extraídas da obra de Jean Delumeau: O peca do e o