Nova apostila de enologia
A importância das bebidas alcoólicas na sociologia da história humana é pouco conhecida. Entretanto, a própria história positivista e respaldada por métodos científicos comprobatórios, registra esporádica e aleatoriamente na saga das sociedades humanas o que esse homem comeu, bebeu, trajou, onde residiu, assim como de que forma se divertiu, curou e consolou. A manufatura, a produção e o comércio da época moderna respaldaram-se exatamente neste tipo de mercadorias: alimentos, bebidas, drogas e tecidos. O álcool apresenta duas faces em que o maniqueísmo manifesta-se de acordo com os critérios sociais, religiosos ou políticos: os danos deletérios do álcool e seu uso excessivo, com enfermidades, vício, demência, assim como, antagonicamente, todas as formas de celebração, de festa, de convívio social, que costumam ser permeadas por esse mesmo elemento. Segundo Carneiro[1]: “o brinde festivo, o uso do vinho como representação cristã ou a refeição acompanhada por uma cerveja ou caipirinha são expressões da importância sociocultural dos múltiplos usos das bebidas”. O álcool como questão filosófica evoca o debate sobre a natureza de suas influências na mente humana e dos estados alterados de consciência por ele induzidos. Ao longo da expansão comercial, o álcool constituiu-se num alimento-droga, cujo consumo acompanhava a comida, como o apaziguamento da dor e o entusiasmo da festa. Adam Smith, apesar de reconhecer os malefícios do álcool, propõe seu comércio livre. Entretanto, Marx & Engels identificam o papel do álcool como um consolo inevitável, da única maneira de se suportar a dor da exaustão no trabalho. Lê-se num trecho do clássico O Capital: “É natural, portanto, que a embriaguez reine nesta classe desde a infância”.
1.1. A saga dos fermentados: o vinho e a cerveja
Supõe-se que o primeiro contato do nosso antepassado primitivo, o proto-homem, com a bebida alcoólica[2] foi ao ingerir