Ainda que o debate não figure com tanto relevo no pensamento dos fundadores do governo representativo quanto no das análises do século XIX, é evidente que, desde suas origens, a idéia de representação esteve ligada à da discussão, nesse tipo de governo. Dispositivos legais adotados na Inglaterra, nos Estados Unidos e na França comprovam esse fato: os representantes gozam da mais ampla liberdade de expressão dentro do recinto da assembléia. O elo entre representação e discussão só pode ser entendido pela introdução da noção intermediária de assembléia. O governo representativo sempre foi interpretado e justificado como um sistema político em que a assembléia desempenha um papel decisivo. Seria possível imaginar, como assinala corretamente Schmitt, que a representação fosse o apanágio de um único indivíduo, designado e autorizado pelo povo.(11) É inegável, porém, que o governo representativo não foi proposto, nem estabelecido, como um regime em que o poder seria confiado a um único indivíduo escolhido pelo povo; ao contrário, foi criado como um regime em que um órgão decisório coletivo deveria ocupar uma posição central. Schmitt e diversos outros analistas posteriores vêem muito mais do que a existência de um vínculo entre a idéia de representação e o papel da assembléia: consideram o papel predominante atribuído à assembléia como efeito de uma crença anterior e mais fundamental nas virtudes do governo da verdade (veritas non auctoritas facit legem).(12)Segundo essa linha de interpretação, a estrutura de crenças que justifica o governo representativo, definido como governo por meio de uma assembléia, seria a seguinte: a verdade deve ser a base da lei, o debate é o caminho mais adequado para determinar a verdade; portanto, o órgão central de tomada de decisões deve ser um local de debates, em outras palavras, uma
assembléia.