O mito da neutralidade científica
O que é ciência? Talvez a ciência não possa nem ser definida. Em geral, é mais conceituada do que propriamente definida. Para o grande público, ciência é um conjunto de conhecimentos “puros” ou aplicados, produzidos por métodos rigorosos, comprovados e objetivos, fazendo-nos captar a realidade de em modo distinto da maneira como a filosofia, a arte, a política ou a mística a percebem. A verdadeira ciência seria um conhecimento independente dos sistemas sociais e econômicos. Seria um conhecimento que, baseando-se no modelo fornecido pela física, se impõe como uma espécie de ideal absoluto. Não há ciência “pura”, “autônoma e “neutra”, como se fosse possível gozar do privilégio de não se sabe que “imaculada concepção”. Espontaneamente, somos levados a crer que o cientista é um indivíduo cujo saber é inteiramente racional e objetivo, isento não somente das perturbações da subjetividade pessoal, mas também das influências sociais. A “razão” científica não é imutável. Ela muda. É histórica. Suas normas não tem garantia alguma de invariância. Tampouco foram ditadas por alguma divindade imune ao tempo e às injunções da mudança. Trata-se de normas historicamente condicionadas. Enquanto tais, evoluem e se alteram. isso significa que, em matéria de ciência, não há objetividade absoluta. Também o cientista jamais pode-se dizer-se neutro, a não ser por ingenuidade ou por uma concepção mítica do que seja a ciência. A imagem do mundo que as ciências elaboram, de forma alguma pode ser confundida com uma espécie de instantâneo fotográfico da realidade tal como ela é percebida. Ela é sempre interpretação. A produção científica se faz numa sociedade determinada que condiciona seus objetivos, seus agentes e seu modo de funcionamento. É profundamente marcada pela cultura em que se insere. Carrega em si os traços da sociedade que a engendra, reflete suas contradições, tanto em sua organização interna quanto em suas aplicações. Talvez não seja exagero dizermos que o