A galinha cega

2091 palavras 9 páginas
Na manhã sadia, o homem de barbas poentas, entronado na carrocinha, aspirou forte. O ar passava lhe dobrando o bigode ríspido como a um milharal. Berrou arrastadamente o pregão molengo:

- Frangos BONS E BARATOS!

Com as cabeças de mártires obscuros enfiadas na tela de arame os bichos piavam num protesto. Não eram bons. Nem mesmo baratos. Queriam apenas que os soltassem. Que lhes devolvessem o direito de continuar ciscando no terreiro amplo e longe.

- Psiu!

Foi o cavalo que ouviu e estacou, enquanto o seu dono terminava o pregão. Um bruto homem de barbas brancas na porta de um barracão chamava o vendedor cavando o ar com o braço enorme.

Quanto? Tanto. Mas puseram-se a discutir exaustivamente os preços.

Não queriam por nada chegar a um acordo. O vendedor era macio. O comprador brusco.

- Olhe esta franguinha branca. Então não vale?

- Está gordota… E que bonitos olhos ela tem. Pretotes… Vá lá!

O homem de barbas poentas entronou-se de novo e persistiu em gritar pela rua que despertava:

- Frangos BONS E BARATOS!

Carregando a franga, o comprador satisfeito penetrou no barracão.

- Olha, Inácia, o que eu comprei.

A mulher tinha um eterno descontentamento escondido nas rugas.

Permaneceu calada.

- Olha os olhos. Pretotes…

- É.

- Gostei dela e comprei. Garanto que vai ser uma boa galinha.

- É.

No terreiro, sentindo a liberdade que retornava, a franga agitou as penas e começou a catar afobada os bagos de milho que o novo dono lhe atirava divertidíssimo.

A rua era suburbana, calada, sem movimento. Mas no alto da colina dominando a cidade que se estendia lá embaixo cheia de árvores no dia e de luzes na noite. Perto havia moitas de pitangueiras a cuja sombra os galináceos podiam flanar à vontade e dormir a sesta.

A franga não notou grande diferença entre a sua vida atual e a que levava em seu torrão natal distante. Muito distante. Lembrava-se vagamente de ter sido embalaiada com companheiros mal-humorados. Carregaram os

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