lucio confissao
Mário de Sá-Carneiro e A confissão de Lúcio
Pedro Eiras
Universidade do Porto Resumo:
Em A confissão de Lúcio (1914), Mário de Sá-Carneiro avalia todas as personagens através de uma escala rigorosa: entre o grau zero da desprezível burguesia e o ponto inefável do artista, Ricardo, Lúcio, Gervásio oscilam, como uma dolorosa “qualquer coisa de intermédio”. Se ninguém se pode furtar a ser avaliado nessa hierarquia, cada personagem deve, contudo, inventar um ponto de fuga, um contágio, a continuidade de si próprio num outro. Em suma, escrever-se outro – ou mesmo sacrificar a escrita à experiência superior do silêncio. Palavras-chave: Mário de Sá-Carneiro; A confissão de Lúcio; estética; metonímia. Abstract:
In A confissão de Lúcio (Lúcio’s Confession, 1914), Mário de Sá-Carneiro places all of his characters on a precise scale: at the bottom is the despicable bourgeoisie; at the top is the artist, whose characteristics cannot be articulated. Ricardo, Lúcio and Gervásio oscillate between these points; they are the “something in the middle”. Although no one character can avoid being evaluated according to this hierarchy, nonetheless each character must invent a means of escape – the continuation of himself in the other. In short, he must write himself other – or even sacrifice writing for the superior experience of silence. Keywords: Mário de Sá-Carneiro; A confissão de Lúcio; esthetics; metonymy.
RCL
Convergência Lusíada, n. 26, julho - dezembro de 2011
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Pedro Eiras
1. O desejo e o abismo
Eu não sou eu nem sou o outro,
Sou qualquer coisa de intermédio:
Pilar da ponte de tédio
Que vai de mim para o Outro.
Sá-Carneiro, Mário de, “7” (1994a, p. 14)
Este ensaio pretende descrever “qualquer coisa de intermédio”: uma confissão labiríntica – tão densa, elíptica e misteriosa que excede o simples “eu” civil de Lúcio Vaz e o leva a vislumbrar o Mistério. Ora, o Mistério, com maiúscula, é