Indios
116 OS DIREITOS DO ÍNDIO NO BRASIL. NA ENCRUZILHADA DA CIDADANIA Alcida Rita Ramos
Seminário Nacional: “A Proteção dos Direitos Humanos nos Planos Nacional e Internacional: Perspectivas Brasileiras”. Instituto Interamericano de Direitos Humanos/Fundação Friedrich Naumann/Comitê Internacional da Cruz Vermelha. Brasília, 15-17 e julho de 1991.
Brasília 1991
A máquina da tutelar1 O movimento indígena brasileiro vai fazer 21 anos, mas os índios continuam no estado liminar de juvenilidade no qual o Estado brasileiro os congelou desde 1916, com a publicação do Código Civil. Em companhia dos menores de 21 anos e maiores de 16, dos pródigos e, até 1985, das mulheres casadas, os índios são declarados "relativamente incapazes" para exercer certos atos da vida civil. Se, por um lado, a figura do relativamente incapaz perpetua o eterno estereótipo do índio como criança, por outro lado, é o produto de um malabarismo jurídico do Estado brasileiro que, reconhecendo a diversidade cultural dos povos indígenas, achou nele uma forma de protegê-los do esbulho explícito por parte da sociedade nacional. Ao se criar o índio relativamente incapaz, criou-se também a necessidade da figura do tutor. E quem poderia ser o tutor dos índios senão o próprio Estado brasileiro? Criou-se então o SPI (Serviço de Proteção aos Índios) em 1910 que, em 1968, iria transformar-se na grande máquina burocrática chamada FUNAI (Fundação Nacional do Índio). Nascido no Ministério da Guerra, o órgão tutelar palmilhou o caminho de vários ministérios até chegar hoje ao Ministério da Justiça. Nessa via crucis ministerial, o SPIFUNAI foi-se despindo da roupagem humanista de seu fundador, o Marechal Rondon, até, nos anos 80, ganhar a alcunha de "tutor infiel". Nesse strip-tease ideológico, transformou seus deveres de guardião dos interesses indígenas em direito de guardador de índios, ao assumir cada vez mais o papel de intermediário de interesses estatais e privados, principalmente, no