carr Vinte anos de Crise cap 5
V
A CRÍTICA REALISTA
Os FUNDAMENTOS DO REAUSMO expostas em capítulo anterior, o realismo entra em cena muito após a utopia, e como forma de reação contra ela. A tese de que "a justiça é o direito do mais forte" era, com efeito, familiar no mundo helênico. Mas jamais representou nada além do que protesto de uma minoria sem influência, atônita pela dis crepância entre a teoria política e a prática política. Durante a supremacia do Império Romano, e mais tarde da Igreja Católica, o problema dificilmente poderia ser levantado; pois o bem polí tico, primeiramente do Império, depois da Igreja, podia ser visto como idêntico ao bem moral. Foi somente com a quebra do sis tema medieval que a divergência entre teoria e prática políticas tornou-se aguda e desafiadora. Maquiavel foi o primeiro impor tante realista político.
O ponto de partida de Maquiavel é uma revolta contra a utopia do pensamento político da época:
"Sendo minha intenção a de escrever algo que seja útil a quem o ler, parece-me mais apropriado procurar a verdade real do que a imaginação; pois muitos descreveram repúblicas e prin cipados que, de fato, jamais foram vistos ou conhecidos, porque como se vive está tão distante de como se deveria viver, que aquele que renega o que foi feito, pelo que deveria ter sido feito, cedo defronta sua ruína, em lugar de sua preservação".
Os três princípios essenciais, implícitos na doutrina de
Maquiavel, são as pedras fundamentais da filosofia realista. Em primeiro lugar, a história é uma seqüência de causa e efeito, cujo
POR RAZÕES
86
E. H.
CARR
curso se pode analisar e entender através do esforço intelectual, porém não (como os utópicos acreditam) dirigida pela "imagi nação". Em segundo lugar, a teoria não cria (como presumem os utópicos) a prática, mas sim a prática é quem cria a teoria. Nas palavras de Maquiavel, "bons conselhos, venham de onde vie rem, nascem da sabedoria do príncipe, e não a sabedoria do prín cipe dos bons conselhos". Em terceiro