ídolos
Ao prefaciar seu Crepúsculo dos ídolos, Nietzsche faz duas afirmações complementares: “existe poder de curar mesmo no ferimento” e “há mais ídolos do que realidades no mundo.” A filosofia de Nietzsche não é nem sistemática nem tampouco tributária da linguagem filosófica do século XIX. Durante o século XX o iconoclasta alemão acabou se tornando ídolo. Em razão disto, chegou o momento de voltar contra Nietzsche seu próprio método ou ausência dele. A implicância do filósofo alemão com Sócrates é evidente. Ao longo de um capítulo ácido, ele procura demolir o ídolo grego. O problema de Sócrates, entretanto, é um monumento construído sobre as nuvens. Sócrates não deixou uma só linha escrita. Sabemos que um homem chamado Sócrates viveu no século IV a.C., em Atenas, que se dedicou à filosofia e foi condenado a morrer tomando veneno. Nada mais sabemos! Platão e Xenofonte referem-se a um tal Sócrates, que teria dito isto ou aquilo. Entretanto, como Sócrates nada deixou escrito não podemos verificar a veracidade das palavras atribuídas ao tal Sócrates por Platão e Xenofontes. Assim, não podemos descartar a hipótese de ambos terem construído uma personagem chamada Sócrates atribuindo a mesma suas próprias idéias. Se voltasse contra Sócrates o princípio da dúvida irônica que lhe foi atribuída por seus discípulos (tudo que sei é que nada sei), Nietzsche certamente não perderia seu tempo em criticar uma personagem. Ao criticar uma personagem, o filósofo alemão pode ter criado um simulacro. Ironicamente nunca teremos condições de saber quando Nietzsche se refere ao homem Sócrates, que nada deixou escrito, ao personagem de Platão e de Xenofonte, ou ao simulacro que ele próprio criou da personagem. Nos itens 2 e 3 do mesmo capítulo, Nietzsche refere-se às características de Sócrates: feio, oriundo do populacho, etc... Não existe um único registro confiável que nos