O ser da compreensão
A psicoterapia, seja qual for a teoria em que se apóia, consiste precisamente em reaprender a lidar com os demais, mediante a interação com o Outro, no caso de terapia de grupo.
Mesmo sem a presença do outro, o ser no mundo é ser com os outros. Estar só é estar privado do outro, num modo deficiente da coexistência, que constitui uma das estruturas do ser no mundo. O conhecimento do outro, pois, supõe a compreensão da existência como ser da coexistência. A relação ontológica como o outro se torna então uma projeção “dentro do outro” da relação ontológica de si para si. “O outro é um duplo si”.
O outro fornece um modelo para construção da imagem de si. Por ser outro, contudo ele também revela que a imagem de si comporta uma parte igual de alteridade.
A ambigüidade da compreensão do outro, que se origina na compreensão do desconhecido que cada um é para si, revela-se em todos os relatos míticos. Todo mito fundamente-se em todos os relatos míticos. Todo mito fundamente-se na duplicidade do mundo, definido como real e irreal ao mesmo tempo. A abordagem mística consagra, mas não resolve o problema da duplicidade. Até a imagem da transcendência assume a dualidade, quiçá a multiplicidade. “O homem é em sua estrutura homo duprex”.
Já a questão do reflexo propõe a existência de um duplo imaterial, idêntico e, contudo inverso.
O tema da dupla personalidade foi excelentemente ilustrado por Otto Rank, que atribui a origem do conceito de alma ao reconhecimento do reflexo. Já Borges aponta para outra fonte do homem duplo: o sonho. Espelho e sonho trazem a vida seres que não existem, e assim fazem o sonhador e o refletido incorrerem em terrível pecado, pois só Deus pode criar seres. O espelho revela-se em sua função Mágica.
Enquanto o espelho cria a imagem, o sonho inaugura o reino do imaginário. O