O PRISIONEIRO DA GRADE DE FERRO
Ana Elisa Liberatore S. Bechara
“Os muros do cárcere representam uma violenta barreira que separa a sociedade de uma parte de seus próprios problemas e conflitos.”
Alessandro Baratta[1] A visão inicial de uma grande e densa nuvem confunde o espectador, que demora alguns segundos para entender seu significado. Aos poucos, a nuvem se dispersa e em seu lugar começa a surgir, reconstruindo-se, o Complexo Penitenciário do Carandiru. Na verdade, o que se vê na primeira cena do filme O prisioneiro da grade de ferro[2] é a implosão da referida unidade prisional, transmitida de trás para frente, de forma a fazê-la ressurgir das cinzas e poeira. O fascínio da imagem guarda um significado profundo: embora tenha sido destruído, o Carandiru retorna, como um fantasma, a assombrar a memória brasileira[3]. Revela-se, desde logo, o intuito do diretor Paulo Sacramento: discutir a realidade que, mesmo após a emblemática destruição do Carandiru, em 2002, continua presente em nosso sistema prisional. Somente em razão dessa seqüência inicial, o filme já estaria a merecer todos os prêmios nacionais e internacionais que obteve.[4] Mas seus méritos vão muito além. O prisioneiro da grade de ferro é resultado da busca da realidade carcerária no Brasil, em toda sua complexidade. Para tanto, Paulo Sacramento confrontou sua visão pessoal, baseada em pesquisas, leituras e entrevistas realizadas, com o olhar dos próprios presos da Casa de Detenção Professor Flamínio Fávero, localizada no complexo penitenciário Carandiru, a maior prisão então existente na América Latina. A idéia do diretor não poderia ter sido mais autêntica: após a realização de curso de vídeo, os internos da unidade prisional receberam câmeras, com as quais, por cerca de sete meses, registraram livremente o que para cada um deles representava o cárcere. Tem-se, então, uma obra que não aposta na