A dádiva no mundo contemporâneo
A relevância do problema do alcoolismo para a área de saúde pública e para o sub-setor de saúde mental é inegável conforme os dados compilados pela Coordenação de Saúde Mental do Ministério da Saúde (2003). Seis por cento da população brasileira apresenta transtornos psiquiátricos graves decorrentes do uso de álcool e outras drogas, e 10% da população mundial sofre com transtornos relacionados a esse uso. No Brasil, em 2001, foram internadas 84.467 mil pessoas por problemas relacionados ao uso de álcool, com um custo de mais de 60 milhões de reais para o Estado. No entanto, apesar desse quadro, das iniciativas profissionais e das políticas de saúde voltadas para esse segmento da população, ainda existe um vasto campo de preconceitos envolvendo a presença e organização de outras formas de apoio ao alcoolismo na sociedade. E daí cabe perguntar qual o espaço de interlocução possível entre o campo técnico e acadêmico e as possibilidades de recuperação de pessoas que sofrem com o alcoolismo que tem como base a força de um grupo cuja maior causa se funda sobre a "dádiva da sobriedade".
Partindo do cenário acima é que comentamos o livro de Leonardo Mota, apontando como um dos méritos de seu trabalho a aplicação do estudo sociológico a um problema social e de saúde reconhecido – o alcoolismo – pela perspectiva de análise dos grupos de AA (Alcoólicos Anônimos) que surgiram nos Estados Unidos em 1935 e no Brasil, em 1947. Baseado em uma rigorosa pesquisa empreendida, o autor assinala a possibilidade de rever a literatura laica sobre os grupos de AA e superar a superficialidade que acabam reservando na área acadêmica ao estudo sobre esses grupos. Associando a essa revisão as técnicas de observação participante, as entrevistas, os questionários e as histórias de vida com alguns dos membros dos grupos estudados, Mota tem acesso