Vigiar e punir
MARGINAIS E DESVIANTES
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Howard S. Becker
Todos os grupos sociais fazem regras e tentam, em alguns momentos e em algumas circunstâncias, fazer com que elas sejam seguidas. Regras sociais definem situações sociais e os tipos de comportamento apropriados a elas, especificando algumas ações como “certas” e proibindo outras como “erradas”. Quando uma regra é imposta, a pessoa que se supõe tê-la transgredido pode ser vista como um tipo especial de pessoa, alguém que não se espera que viva segundo as regras com as quais o grupo concorda.
Ela é vista como um marginal ou desviante.
Mas a pessoa que recebe o rótulo de marginal pode ter uma visão diferente da questão. Ela pode não aceitar a regra em função da qual está sendo julgada e pode não considerar aqueles que a julgam como competente ou legitimamente autorizados para julgá-la. Conseqüentemente, surge um segundo significado do termo: a pessoa que quebra as regras pode sentir que seus juizes são desviantes.
A seguir, tentarei esclarecer a situação e o processo indicado por esse termo de duplo conteúdo: as situações de transgressão e de imposição de regras, e os processos pelos quais algumas pessoas vêm a transgredir regras e outras a impô-las.
Algumas distinções preliminares são necessárias. As regras podem ser de muitos tipos. Elas podem ser formalmente promulgadas como lei e, nesse caso, o poder de polícia do Estado pode ser usado para impô-las. Em outros casos, representam acordos informais, aos quais se chegou recentemente ou que estão vinculados à sanção da idade e da tradição; regras desse tipo são impostas por sanções informais de várias espécies.
De maneira semelhante, quer uma regra tenha força de lei ou tradição, que seja ela simplesmente o resultado de consenso, sua imposição pode ser tarefa de algum corpo
* In: Uma Teoria da Ação Coletiva (Rio de Janeiro, Zahar Editores, 1977, cap. 3, p. 53-57). Tradução de
Márcia Bandeira de Mello Leite Nunes do cap. 1, de Becker, H. S.,