Uma abelha na chuva
Produto magnificente da criatividade e imaginação ímpares de Carlos de Oliveira, a obra narrativa Uma abelha na chuva (publicada em 1953) evidencia tanto a filiação do autor no movimento Neo-realista português como a sua transcendência. O neo-realismo insurge-se contra a servidão humana desenvolvendo o conceito marxista “ A terra é de quem a trabalha” e o romance não se distancia vez alguma do humanitarismo socialista .O romance denuncia um Portugal empobrecido, rural, aprisionado e castrado pelo Estado Novo (um país que se encontra num coma induzido) através do tenso e denso trabalho verbal utilizado pelo autor. De uma riqueza simbólica extrema esta obra é uma espécie de tragédia interposta por diversos destinos trágicos. Exemplo de riqueza de símbolos estão presentes nos pares antónimos mel/chuva, mel/tabaco, mel/fel, mel/cinzas, fogo/água, abelha/água, corrosão/cinzas, fonte/rio ou mar/poço com variações de acordo com as representações e os momentos textuais. A tragédia resulta da interação dos elementos que metamorfoseiam o mel em fel e a corrosão em cinzas. No trilho do neo-realismo, as personagens de Uma Abelha na Chuva surgem introduzidas numa trama de circunstâncias comandadas pelo supremo valor do dinheiro. Para além disso, a composição da narrativa baseia-se em jogos de focalização interna através dos quais acede-se ao rumor emocional de cada uma das personagens, sendo nessa dimensão interior que presenciamos o desencadear dos momentos de avanço da ação. A ação situa-se no Montouro, uma aldeia de Gândara, no Outono, desenrolando-se em torno de um par principal – Álvaro Silvestre e Maria dos Prazeres, providos de um estatuto social e económico assente no casamento por conveniência que os une, a ele proveniente de uma família de comerciantes abastados – um burguês portanto -, e a ela, descendente de uma família de fidalgos arruinados. Toda a ação decorre desta relação falhada e estéril, árida e agreste (como árida e agreste é a região