Trabalhos
Mônica de Castro Editora vida e consciência
Onde tudo se passou
Aquela não seria uma noite convencional na pequena cidade de Barra do Bugres, em Mato Grosso, a 150 km de Cuiabá, onde apenas os uivos do vento acompanhavam a agonia de Severina, que se retorcia na cama com as dores do parto. Fazia já sete horas que praticamente agonizava, sentindo as contrações aumentarem a cada minuto, a barriga estufando como se, a qualquer momento, fosse estourar. A parteira enfiava, sem cerimônia, os dedos entre suas pernas, tentando localizar os gêmeos que lutavam entre si por uma chance de vida. ― Será que não é melhor chamar um doutor? ― sugeriu Roberval timidamente, apertando nas mãos o chapeuzinho roto de lavrador. ― Não, não, não ― objetou a parteira severamente. ― Médico, nem pensar. ― Mas ela está sofrendo... ― Isso não é nada. Passa logo. Em breve os bebês nascem e tudo se acaba. ― Mas Dona Leocádia, a coisa parece feia. Minha Severina não vai resistir. ― Saia daqui, homem! ― gritou ela, enxotando Roberval para fora do quarto. Roberval saiu cabisbaixo. Não entendia o que dera em Severina para contratar os serviços daquela mulher esquisita, que aparecera na roça de repente, intitulando-se parteira, justo quando ela estava para ganhar criança. Ainda se lembrava do dia em que conhecera Dona Leocádia. Ela chegara com ares de figura importante, perambulando entre as ruas com olhos ávidos. Andou para cima e para baixo, sempre observando tudo, até que bateu com os olhos em Severina e seu ventre ainda pouco intumescido de quase quatro meses de gravidez.
Com muito jeito, aproximou-se de Severina e fez amizade com ela, dizendo-se parteira interessada no seu bem-estar. Roberval achou aquilo muito estranho, mas Leocádia começou a fazer-lhes visitas diárias e a dar-lhes conselhos sobre a saúde da mulher e do bebé. Trazia coisas gostosas para Severina comer, dava-lhe remédios e vitaminas, tudo para garantir que a criança viesse ao mundo saudável e forte. Em pouco