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A mais recente publicação de José Leon Machado, o romance Não me guardes no coração, apresenta-se como uma obra passível de diferentes leituras, algumas delas quase contraditórias entre si. A par da aparente linearidade (e até simplicidade) da intriga – que gira em torno das aventuras de férias de um jovem universitário português em França durante quase um mês – somos confrontados, de forma mais ou menos implícita, com um conjunto de questões que nos obrigam a reflectir sobre valores actuais e sobre diversos aspectos da contemporaneidade. Narrativa de viagens ou romance pícaro, a interpretação resulta da leitura linear ou metafórica que a intriga permite, sobretudo a partir da personagem principal, uma vez que esta encarna, simultaneamente, propriedades heróicas e disfóricas, como é o caso de um certo “donjuanismo” latente. O romance, ao narrar o encontro de jovens oriundos de diferentes países, alguns da União Europeia, como é o caso de Portugal, da França e da Bélgica, mas também da Noruega, de Israel, da Turquia e da Argélia, permite dar conta de alguns estereótipos culturais, uma vez que, apesar de muito jovens, as personagens revelam inúmeros preconceitos em relação aos outros e face às diferenças existentes entre si. Desta forma, torna-se evidente ao leitor a existência de uma tentativa de desmistificação das noções cultura e/ ou civilização ocidental e mesmo cultura europeia, já que o convívio assíduo entre as personagens acentua vivamente as diferenças e as incompatibilidades existentes. Assistese, pois, ao desfazer do mito do “encontro de culturas”, ao mesmo tempo que se realiza a revisitação – e consequente desconstrução – de uma imagem eufórica da França enquanto sociedade cultural, solidária e igualitária. De alguma forma, este país é caracterizado mais como “libertino” do que “liberal”, uma vez que, aparentemente pouco