seminario
A formação humanista de Freud é fundamental na consideração de como ele constrói seu caminho teórico.
No momento em que Freud se propõe a fazer considerações sobre a sabedoria já pertencente àqueles que são artífices da palavra – os poetas – no texto Escritores criativos e devaneio, ele apela para o tesouro popular constituído pelo corpo infindável das lendas, mitos, contos populares, escrevendo que tudo leva a crer que os mitos, por exemplo, “são muito provavelmente vestígios deformados dos fantasmas de desejos comuns a nações inteiras, e representam sonhos seculares da jovem humanidade” (1908, p. 157). Como nos lembra Bellemin-Noël (1996), Freud escreveu repetidamente que os psicanalistas deveriam escutar o que as ficções contam, colocando-se em uma posição de abertura às sugestões de seus inconscientes.
A mitologia seria uma verdadeira fonte do inconsciente dos povos antigos, na qual apreendiam suas aspirações e seus terrores. Os personagens mitológicos que passeiam pela obra freudiana são elevados ao status de figuras do inconsciente, sustentando boa parte dos argumentos de sua construção metapsicológica, não sendo menos reveladoras da alma humana que os sonhos e os sintomas, mas abrindo uma visão em outra realidade e alargando a existência humana e suas possibilidades. Funcionam assim Édipo e Narciso: verdadeiras figuras-matrizes do inconsciente.
É seguindo, portanto, os rastros deixados por Freud desde os tempos em que se aventurava nas searas da descoberta do inconsciente, que podemos puxar um dos fios que dá acesso ao entendimento do lugar da literatura para ele, já começando a clarear o fato de que a relação de Freud com os escritores se dá de modo paradoxal, ora funcionando como modelo, ora como rivais, por já conhecerem aquilo que com muito custo a teoria