Rotacismo
O rotacismo é um fenômeno regular e recorrente no português. Ainda assim, é alvo de estigma. Na literatura linguística, denomina-se rotacismo a neutralização de uma líquida lateral por uma líquida vibrante em sílabas do tipo CCV, como, por exemplo, „blusa‟ por „brusa‟. Em algumas regiões do Brasil, os falantes neutralizam os traços distintivos desses dois fonemas. Isso, possivelmente, deve-se ao fato de serem do ponto de vista articulatório muito próximo. Quanto ao ponto de articulação, há muitas semelhanças, pois ambas são realizadas com a ponta da língua tocando os alvéolos dos dentes. No entanto, são fonemas distintos no português uma vez que, de acordo com o princípio da comutação a pares mínimos idênticos ou análogos de palavras, a troca de /l/ por /r/ pode implicar em mudança de significado como, por exemplo, no caso das palavras “mal” e “mar” (cf. COX; ASSAD, 1999). Trata-se de tendência natural, observada, na evolução das línguas românicas, cuja raiz é o latim vulgar. Os dados do quadro 1 mostram que, no latim vulgar, o padrão silábico CCV tinha um /l/ que se converteu em um /r/ no português. Então, o que é tratado como suposto “erro” é, na verdade, prosseguimento de uma tendência muito antiga no português (e em outras línguas) que os falantes rurais ou não escolarizados muitas vezes levam adiante (BAGNO, 2007, p. 73-74). Assim, nesta perspectiva, é possível afirmar que a neutralização do traço distintivo dos fonemas /l/ e /r/ não se trata de um “erro”, mas sim efeito de um processo cíclico por qual passa a nossa língua: formas do passado (como por exemplo, do latim) podem se repetir em formas linguísticas atuais, como é o caso do rotacismo; a classificação dada como “erro” nesse processo acarreta em um preconceito linguístico, pois “o preconceito se baseia na crença de que só existe, uma única língua portuguesa digna deste nome e que seria a língua ensinada nas escolas, explicadas nas gramáticas e catalogadas nos dicionários” (BAGNO,