Resenha sobre heresias
Constantino cria que havia sido escolhido pelo deus cristão para desempenhar o papel mais importante desde Adão e Eva. Para cumprir esse ‘verdadeiro chamado’, e ao contrário de uma leitura bastante difundida, Paul Veyne lembra que ele assumiu a posição de “protetor e propagandista” (Veyne, 2010: 138) concedendo benefícios – templos, por exemplo – e privilégios – fiscal e arbitral – que as religiões ditas pagãs já gozavam; ou seja, Constantino teria de alguma forma apenas colocado o então perseguido e mal-quisto cristianismo em equidade com o paganismo. Convertido, porém habilidoso, Constantino pendulou entre o cristianismo e as demais religiões. Manteve a fachada pagã do Império para acalmar a aristocracia e fez do cristianismo sua religião privada, não buscando converter seus súditos. O Império continuou com seus cultos públicos a outros deuses e a Europa assim permaneceu até o século VI em vários territórios.
A valorização das representações que Constantino fazia de si mesmo e do cristianismo é uma opção metodológica que faz Paul Veyne ser um crítico dos autores que entendem o imperador como um calculista político em busca de “alicerces metafísicos da unidade e da estabilidade interior do Império” (Veyne, 2010: 79). Sua crítica tem endereço certo: a historiografia dita por ele “marxistizante” ao estilo do historiador Yvon Thébert “e de muitos outros”. No dizer do historiador foi Constantino que pôs o ‘trono’ a serviço do ‘altar’ e não o contrário, pois ele de fato queria que as pessoas se salvassem (Veyne, 2010: 87). Consequência maior dessa experiência foi a definitiva entrada da religião na política e no poder com o estabelecimento da futura e tradicional prática monárquica da religião do trono. Com ironia, pergunta-se no capítulo dez se as razões de Constantino não seriam mais profundas, ideológicas.... Para ele, não! A obediência a Constantino e a manutenção da ordem imperial não precisou ser imposta aos súditos por uma mensagem ideológica