Religiao maquiavel
Embora Roma tenha sido fundada por Rômulo e se reconheça como filhas suas o nascimento e a educação, os céus, julgando que as leis (ordini) de Rômulo não bastavam para tanto império, inspiraram o senado romano para que elegesse Numa Pompílio como sucessor de Rômulo, de modo que as coisas que este deixou de lado foram reguladas por Numa. Este, encontrando um povo ferocíssimo e querendo reduzi-lo à obediência civil com as artes da paz, recorreu à religião como elemento imprescindível para manter a vida civil (civilità ) e a constituiu de modo que, por muitos séculos, não havia tanto temor a Deus como naquela república, o que facilitou todos os empreendimentos que o senado ou os grandes homens de Roma planejaram levar a cabo (Discorsi I, 11).
O problema político do sucessor de Rômulo era o de "reduzir" seu povo "à obediência civil". Fazê-lo, porém, com a força que provém da "ferocidade" não apenas resultaria em algo puramente provisório, mas criaria rapidamente um movimento cujo termo final seria a dissolução da sociedade. Isso porque, no âmbito de uma coletividade política, a força enquanto tal somente pode ser a da maioria, enquanto a obediência necessária ao vivere civile pode ser devida unicamente a uma minoria. Portanto, para garantir à comunidade política coesão e duração, o fundamento da obediência precisa ser buscado em algo diverso da força.
Isso explica porque Numa, para alcançar seu objetivo (de reduzir à obediência civil um povo ferocíssimo), não tratou o povo no terreno que lhe era próprio enquanto agente do Estado, isto é, o da força, mas compreendeu que precisava voltar-se "às artes da paz". Estas, na passagem da obra maquiaveliana citada acima, não consistem em