Racionalismo e Processo Civil
Introdução
O processo civil brasileiro sofreu uma forte influência do paradigma racionalista. Tal influência pode ser percebida na premissa sob a qual se fundamenta o sistema recursal, qual seja, a de que há uma verdade a ser “desvelada” no processo, de tal sorte que o ele é conduzido, pela via recursal, aos Tribunais Superiores, teoricamente compostos por juízes capazes de revelar o verdadeiro e único sentido da lei, de acordo com a visão racionalista.
1. A ORIGEM DO RACIONALISMO
1.1 O papel do mito na sociedade
Jaques Lenoble e François Ost analisam a influência racionalista nas instituições do mundo moderno através de um resgate histórico da humanidade. Segundo estes autores, para o homem primitivo o mundo era uma profusão, na qual não se distinguiam o homem e a natureza. Tudo se reduzia a uma mesma comunidade, toda ela subordinada às ordens emanadas de seres míticos, sobrenaturais, sobre os quais a humanidade não tinha qualquer controle. 1
O pensamento mítico, que sustentava a realidade primitiva, é a expressão das emoções humanas, regido por uma lei que assimila as coisas mais distintas entre si, que ignora o princípio da não-contradição. É natural, porém, que o homem primitivo, em processo de elaboração lingüística, tivesse um reduzido grau de distinção entre sua expressão e suas emoções. 2
Na fase inicial de apreensão do mundo pelo pensamento, o mito exerce uma função de regulação da vida social, pois é através dele que o homem pode se situar na escala de valores, e encontrar seu lugar no mundo.3 O mito é, assim,
“toda a cristalização de uma imagem pura e transcendente que não permita resolver o existente a partir de um projeto autônomo de crítica às estruturas do comportamento individual ou social.”4
É a partir do mito que ocorre a apreensão e compreensão do mundo, através da substituição do tempo histórico por fábulas, nas quais as ações e os acontecimentos