Os deuses disputam o mercado
Carta Capital, 25 de fevereiro de 2004 (www.cartacapital.com.br)
AO RECEBER O PRÊMIO NOBEL DE ECONOMIA em 2002, o economista Vernon Smith levantou um brinde à «criação mais significativa da humanidade”, o mercado, e aos antigos mandamentos judaicos, «não roubarás ou cobiçarás a propriedade do vizinho, não matarás, cometerás adultério ou prestarás falso testemunho”. Até há pouco tempo, economia e religião eram vistas por muitos como óleo e água, racionalidade versus espiritualidade, ciência versus emoção. Mas pesquisas recentes em vários campos do conhecimento mostram que há tempos os humanos não se dedicavam com tanto afinco a investigar as engrenagens que mantêm vivas, ao mesmo tempo, a religião e a lógica do mercado.
O influente economista Robert Barro, professor da Universidade Harvard, adepto da escola de “expectativas racionais” e famoso por seus estudos sobre os fatores que determinam que alguns países se desenvolvam mais rapidamente do que outros, recentemente voltou-se à religião para explicar a origem do crescimento econômico. Em um artigo intitulado Religião e Crescimento Econômico, Barro e sua co-autora, Rachel McCleary, argumentam que o crescimento econômico dos países está relacionado a quanto seus cidadãos acreditam em alguns conceitos religiosos, especialmente os de céu e inferno. Surpreendentemente, porém, descobriram que quanto mais esses cidadãos freqüentam a igreja, menos seus países crescem. “Descobrimos que à medida que os países se tornam mais ricos, se industrializam, o tempo das pessoas passa a ser mais valioso”, diz Rachel McCleary, também socióloga de Harvard. “E quando você está envolvido em uma atividade religiosa, você está fora do mercado, ocupado com uma atividade não produtiva.”
Embora seja perda de tempo, do ponto de vista do mercado, freqüentar a igreja, ou mesmo dedicar algumas horas à oração, é imprescindível que o cidadão acredite na possibilidade de um inferno após a morte.