Objetivo de ensinar filosofia
Desidério Murcho: O principal desafio é o total desinteresse da esmagadora maioria dos alunos. Mas este não é um problema específico da Filosofia; calculo que seja exatamente o mesmo que ocorre em outras áreas. Os alunos são hoje subtilmente obrigados a estudar na universidade, porque não se lhes oferece alternativas viáveis e socialmente prestigiantes. O resultado é chegarem à universidade alunos sem qualquer interesse em estudar, sem curiosidade intelectual, sem hábitos de concentração, estudo aturado e raciocínio sofisticado. Tudo o que o aluno espera da universidade é uma certificação para ter um emprego melhor, e pressupõe que tudo é uma farsa em que ele finge que aprende, repetindo os jogos de palavras de que o professor gosta, ao mesmo tempo em que o professor finge que ensina, e no final o professor finge que avalia e o aluno finge que é avaliado. O interesse do professor também não é ensinar bem, porque isso não dá qualquer prestígio. O seu interesse é pesquisar — entendendo-se por “pesquisa” não a investigação do que não se sabe, mas o relato mais ou menos mecânico do que está escrito nos livros.
No que respeita aos alunos com interesse em estudar, a Filosofia acarreta dificuldades peculiares que resultam de duas grandes concepções da disciplina, que têm percorrido a sua vetusta história e que continuam a fazer-se sentir em algumas universidades (mas não em outras). Por um lado, temos uma concepção estritamente cognitivista da Filosofia, concepção que encontramos em filósofos como Aristóteles e Platão, em Tomás de Aquino e Descartes, Hume e Kant, Kripke e Williamson. Mas por outro temos uma concepção não cognitivista que ora vê a filosofia como autoajuda secular, ora como uma prática mística. Estas concepções não cognitivistas de Filosofia são visíveis em filósofos como Epicuro e alguns estoicos (sobretudo romanos), no caso secular, e em Plotino e Dionísio. Ora, os alunos