neurociências
Golgi, Cajal e o Nobel de 1906
Controvérsia célebre marcou o encontro da teoria celular com a neurociência
LUIZ CARLOS
SANTANA DA SILVA
NAZÁRIO DE SOUZA
MESSIAS JÚNIOR
Laboratório de Erros Inatos do Metabolismo,
Instituto de Biologia (campus de Belém),
Universidade Federal do Pará
O embate entre os cientistas Santiago Cajal e Camillo Golgi durante a cerimônia do prêmio Nobel de 1906 é frequentemente citado como exemplo do conflito entre o ‘certo’ e o ‘errado’ em ciência, mas terá sido realmente assim? Eles dividiram o Nobel de Fisiologia ou Medicina “em reconhecimento aos trabalhos sobre a estrutura do sistema nervoso”, mas tinham visões opostas sobre o papel dos neurônios – uma controvérsia que permite discutir aspectos relevantes do desenvolvimento da ciência.
Camillo Golgi
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Para isso, foi necessário um conjunto de transformações históricas e conceituais, caracterizando o que é chamado de mudança de paradigma. Essas transformações ocorreram ao longo de 200 anos, desde que o inglês Robert Hooke (1635-1703), usando um microscópio que construiu, observou e registrou, em 1663, curiosas estruturas em uma fatia de cortiça e deu a elas o nome ‘células’ (na verdade, eram paredes de células mortas). A teoria celular moderna, no entanto, só começaria a ser esboçada em 1839, pelos alemães Mathias
Schleiden (1804-1881) e Theodor
Schwann (1810-1882), e o papel das células como unidades básicas da vida só caminharia para a aceitação unânime décadas depois, com os trabalhos de Robert Remak (18151865) e Rudolf Virchow (1821-1902), também alemães.
Esses pioneiros defendiam que os seres vivos e suas muitas partes internas eram compostos por células.
Alguns órgãos, porém, pareciam resistir a esse reducionismo. Entre esses órgãos estava o cérebro, com suas misteriosas funções.
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A
s dúvidas existentes no final do século 19 sobre a natureza dos