Miguel reale
MIGUEL REALE O novo Código Civil entrará em vigor no próximo dia 11. Para comemorar esse evento não me é possível, porém, nos limites de um artigo de jornal, selecionar as contribuições mais relevantes da nova Lei Civil, parecendo-me mais aconselhável salientar as diretrizes seguidas em sua longa, mas proveitosa tramitação. Antes de mais nada, desejo deixar aqui o reconhecimento dos altos méritos do Código que vai ser revogado, obra monumental do insigne jurista Clovis Bevilaqua, que pensava poder situá-lo entre as linhas da tradição e do progresso, sem prever, todavia, as revoluções sociais e tecnológicas que iriam ocorrer logo após a Primeira Grande Guerra. Isto não obstante, a “Comissão Revisora e Elaboradora do Código Civil”, da qual fui supervisor, estabeleceu, entre os seus propósitos iniciais, o de conservar o máximo possível o disposto no Código de 1916, objeto de preciosos estudos doutrinários e de valiosa jurisprudência, que ainda continuarão a exercer benéfica influência na história do Direito pátrio. Acontece, porém, que, devido às imensas alterações operadas no decurso do século passado, tanto no plano científico e tecnológico como no campo social, era impossível manter disposições legais tornadas incompatíveis com os interesses e necessidades do mundo atual. Bastará dizer que Clóvis Bevilaqua redigiu seu anteprojeto de Código Civil em fins do século dezenove, quando ainda prevaleciam princípios de marcante individualismo. No caso do Brasil acrescia o fato de nossa civilização ainda corresponder a uma sociedade rural e agrária, com a maior parte da população vivendo no campo, ao passo que, hoje em dia, predomina o sentido inverso da vida urbana aberta aos imperativos da socialização do progresso. Por outro lado, nos domínios da Ciência do Direito prevalecia a preocupação oitocentista da escola francesa da