Individualismo e Intelectuais

[Texto no Prelo – Favor não reproduzir]
O individualismo e os intelectuais1

A questão que, há seis meses, divide tão dolorosamente o país está se transformando: o que era, em sua origem, uma simples questão de fato, generalizou-se pouco a pouco. A intervenção recente de um conhecido literato2 muito contribuiu para este resultado. Parece que chegou o momento de renovar, de maneira a chamar a atenção, uma polêmica que se prolonga em repetições inúteis. É por isso que, ao invés de retomar a discussão dos fatos, quisemos dar um salto e alcançar os princípios: focalizamos o estado de espírito dos "intelectuais"3 e as ideias que reivindicam e não o detalhe de sua argumentação. Se eles se recusam obstinadamente a "submeter sua razão à palavra de um general do Exército", tal ocorre porque evidentemente se arrogam o direito de julgar a questão por si mesmos, ou seja, porque colocam sua razão acima da autoridade e os direitos do indivíduo lhes parecem imprescritíveis. Portanto, foi o seu individualismo que determinou a dissidência. Mas, então, afirmam, se pretende-se levar a paz aos espíritos e prevenir o retorno de discórdias semelhantes, é preciso aferrar-se a esse individualismo. Deve-se secar de uma vez por todas essa inesgotável fonte de divisões intestinas. Uma verdadeira cruzada teve início contra essa calamidade pública, contra " esse grande mal do tempo presente".
Aceitamos de bom grado o debate nesses termos. Cremos também que as controvérsias do passado apenas exprimiram superficialmente uma divergência mais profunda, pois os espíritos se dividiram antes sobre uma questão de princípios do que sobre uma questão de fato. Deixemos de lado os argumentos de circunstância endereçados uns aos outros; esqueçamos o caso em si e os tristes espetáculos que testemunhamos. O problema que se coloca diante de nós ultrapassa infinitamente os incidentes atuais e deve ser isolado. 1

Texto original: Durkheim, É. L`Individualismo et les