Hermeneutica jurídica
No Brasil, o Código Penal define que a prática consentida de aborto é um crime que sujeita a abortante a pena de 1 a 3 anos de reclusão e o eventual executor do aborto a pena de 1 a 4 anos de reclusão. Já a simples retirada de um embrião morto não é um ato ilícito, na medida em que a caracterização do aborto exige a ocorrência de uma intervenção que resulte na morte de um feto vivo. Não há, contudo, nenhuma regra específica acerca dos fetos que estão em desenvolvimento, mas que não têm qualquer possibilidade de permanecer vivos após serem dados à luz.
Entre os fetos cuja vida extra-uterina é inviável, uma situação especialmente gritante é a dos anencéfalos, os quais têm uma má-formação congênita que gera a ausência total ou parcial do encéfalo, uma parte do cérebro sem a qual a vida é impossível. É preciso enfrentar, nesse caso, uma questão relevante: comete aborto um médico que realiza procedimento cirúrgico voltado para retirar do útero de uma gestante um feto anencefálico?
Essa é uma questão jurídica delicada, pois envolve decisões moralmente complexas e emocionalmente desgastantes. É também uma questão socialmente relevante, pois abrange tanto a possibilidade de punição dessa prática cirúrgica quanto o acesso de gestantes de futuros natimortos a esse tipo de procedimento médico. Além disso, trata-se de uma questão jurídica muito difícil, na medida em que envolve conceitos tão relevantes quanto fluidos, tais como morte, vida edignidade humana.
Por fim, essa questão está na ordem do dia porque a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde ingressou no STF com uma ação (ADPF n. 54), solicitando a declaração de que seria inconstitucional considerar como aborto a antecipação terapêutica do parto no caso de fetos anencefálicos.
O pedido feito nessa é inusual, pois o autor não solicitou que o Tribunal declarasse a inconstitucionalidade de uma norma expressa, mas apenas que declarasse ser inconstitucional uma determinada forma de