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FUNDAMENTOS E VIRTUALIDADES
DA EPISTEMOLOGIA DA HISTÓRIA: algumas questões
Arno Wehling
INTRODUÇÃO
As virtualidades da epistemologia histórica somente adquirem sua correta dimensão se referidas ao significado maior da própria epistemologia contemporânea. Foi a crescente preocupação com problemas de ordem epistemológica nos diversos campos da atividade científica e na reflexão filosófica que determinou a introdução deste tipo de análise nas discussões sobre a natureza do conhecimento histórico.
Por que ocorreu, ao longo do século, esta crescente preocupação? Parece-nos claro que ela existe na razão direta da conscientização, cada vez mais alargada, de que ocorreu uma profunda crise no conhecimento científico e filosófico que conduziu o saber no Ocidente a partir do século XVII. Se P. Hazard pode falar de uma "crise da consciência européia" para se referir ao alvorecer destas então novas concepções naquele século, podemos também encontrar uma "crise do paradigma clássico" iniciada nas primeiras décadas do século XX.
Tal crise, que consistiu fundamentalmente no questionamento mais ou menos extenso das categorias e extrapolações elaboradas a partir da física newtoniana e da arquitetura filosófica do idealismo, produziu um efeito devastador sobre a fundamentação teórica das ciências. No mundo ordenado do modelo newtoniano1 ou na síntese kantiana,2 o lugar de uma reflexão crítica sobre a ciência estava logicamente limitado à busca de leis sucessivamente mais genéricas - o que fez Comte afirmar que, após a procura filosófica das causas, chegara a ocasião da pesquisa científica das leis.3
Assim compreendidas a ciência e sua reflexão crítica, cabia portanto espaço restrito aos problemas epistemológicos e um espaço muito maior para as questões metodológicas, isto é, os caminhos através dos quais a investigação elaboraria, "descobrindo-o" no real, o conhecimento. Inversamente, quando se deu, como adiante observaremos, a crise do paradigma