Foucault o cuidado de si
OU A LIBERDADE É UMA AGONÍSTICA
Alípio de Sousa Filho
“A partir da idéia que o indivíduo não nos é dado, acho que há apenas uma conseqüência prática: temos que criar a nós mesmos como uma obra de arte.”
Michel Foucault
Começarei pela pergunta já tantas vezes feita: que fazia Foucault no retorno à moral greco-romana antiga? Que efeito procurava produzir (em seus leitores, naqueles que o acompanhavam em sua produção teórica), ao nos transportar do presente (que o ocupou em suas principais obras) a um passado cujos contornos tão diferentes se transformaram ou se perderam? Alguma surpresa nisso? Para não deixar de pensar as coisas como ele próprio as pensou, já deveríamos aqui falar não de “retorno à moral”, no singular, mas de retorno à Antiguidade para o estudo de “morais”. No plural, está toda a diferença. E, como sabem seus leitores, não somente nesse caso. Todo o seu pensamento foi orientado pela concepção radicalmente negadora da tentação do uno.
Como insistiu tantas vezes, Foucault foi atraído pelo fato de que, entre gregos e romanos, não houve a tentativa de imposição de uma moral única a todos, mas produção de “morais” de grupo, morais orientadas para éticas e estilizações da vida, estilos de grupo e para grupos. Ao menos, entre as camadas aristocráticas daquelas sociedades. Os últimos volumes da História da Sexualidade e suas aulas, no Collège de France, entre
1980 e 1982, parte delas reunidas no A Hermenêutica do Sujeito, são exemplos de sua ocupação com o assunto.
Sabemos que o estudo dessas morais levou Foucault a se ocupar com o tema da ética, da estética da existência, da verdade, do sujeito da ação, do sujeito ético da verdade. Assim, leitores, estudiosos, editores “descobriram” encantados: no Foucault ocupado com as éticas greco-romanas antigas se encontra o pensador da liberdade: “As portas do asilo, os muros da prisão desaparecem, dando lugar a falas livres em que gregos e