Filologia Transcrição
II. Articulações O momento de ascensão da burguesia é essencial para a compreensão da evolução e amadurecimento do romance moderno e contemporâneo. Anos como o de 1848, quando várias revoluções se sucederam – a Primavera dos povos, por exemplo – e trabalhadores foram massacrados por toda a Europa, não permitem mais que os escritores permaneçam à parte dos fatos sociais que estão tomando lugar à volta deles. Escrever é, também, ter e expressar uma ideologia específica – mais do que isso, a forma como se escreve é também dotada de significado; a linguagem se torna um campo minado para os escritores. No ensaio Narrar ou descrever? Georg Lukács dedica-se ao estudo das formas de composição do romance que dão nome ao texto, diferenciando-as em uma essência. Para Lukács, os escritores que procuram narrar produzem textos representativos da realidade, não limitados às aparências. Ao narrar, qualquer processo descritivo realizado está essencial e organicamente ligado ao que está sendo contado: nada é superficial. Encontramos bons exemplos em Balzac, Dickens e Tolstoi – na literatura brasileira, como veremos, Machado de Assis é o nosso melhor expoente; já escritores que descrevem – como Flaubert e Zola, como consta no texto – não visam unir a descrição ao restante da narrativa, são momentos desencontrados de seus romances. Lukács coloca que “a descrição rebaixa os homens ao nível das coisas inanimadas” ¹ (LUKÁCS, 1968, 69). Este ensaio mostra claramente como a concepção de mundo do escritor do século XIX está radicalmente ligado à sua literatura e à forma como ela é produzida. Sobre isso, ele comenta: “O escritor precisa ter uma concepção de mundo inteiriça e amadurecida, precisa ver o mundo na sua contraditoriedade móvel, para selecionar como protagonista um ser humano em cujo destino se cruzam os contrários.” (ibidem, grifo meu). Assim, para Lukács, o escritor realista deve apreender as transformações e