Felicidade clandestina
Este livro nasceu de um convite feito a Clarice Lispector, em 1967, para escrever semanalmente no Jornal do Brasil. Seriam crônicas, mas ela mesma declarou: “Vamos falar a verdade: isto aqui não é crônica coisa nenhuma. Isto é apenas. Não entra em gêneros. Gêneros não me interessam mais.”
No entanto, a obra é considerada como livro de contos. Além dos publicados no Jornal do Brasil, acrescentaram-se outros escritos em épocas diversas da vida da autora. Neles há muito de autobiográfico: recordações da infância (a filha do livreiro de “Felicidade Clandestina” existiu; o professor de “Desastres de Sofia” percebeu o tesouro da futura escritora.).
Escritas em primeira pessoa, neste que poderia ser considerado um dos livros de cunho mais autobiográfico da autora, as narrativas resgatam, de uma perspectiva memorialista da mulher adulta, a arguta ingenuidade de seus pensamentos e sentimentos aos oito e nove anos de idade, quando moradora da cidade do Recife, por cujas ruas perambulava, aos saltos, enchendo-as da memória da sua passagem. Esse material, buscado a uma época tenra de sua história pessoal, é utilizado para suas reflexões sobre a vida, a atividade literária e o exercício de um feminismo místico que se torna a marca de seu estilo.
Esta obra reúne 25 contos que tematizam a adolescência, a infância, e a família, sem deixar, em momento algum de se referir as angústias da alma, tal como é próprio da autora.
Os textos não diferem da orientação geral da ficção de Clarice Lispector. Ela pratica a exacerbação do momento interior dos personagens, a ponto de a própria subjetividade entrar em crise. O espírito deles viaja nas asas da memória e da auto-análise. Não se trata, porém, de sondagens psicológicas sentimentais egocêntricas. A inquietação íntima dos personagens se concentra na busca da própria identificação num cotidiano monótono e vazio. As camadas mais profundas da consciência humana são removidas pela