Excerto dos maias e análise
“... Era uma manhã muito fresca, toda azul e branca, sem uma nuvem, com um lindo sol que não aquecia, e punha nas ruas, nas fachadas das casas, barras alegres de claridade dourada. Lisboa acordava lentamente: as saloias ainda andavam pelas portas com os seirões das hortaliças; varria-se devagar a testada das lojas; no ar macio morria à distância um toque fino de missa”.
Análise
Caracterização do espaço físico
Era uma manhã muito fresca, toda azul e branca, sem uma nuvem, com um lindo sol que não aquecia, e punha nas ruas, nas fachadas das casas, barras alegres de claridade dourada. (cap.VIII, p. 258) Vários são os recursos estilísticos presentes neste excerto de Os Maias, de Eça de Queirós:
— riqueza em adjectivação (com presença de dupla e tripla adjectivação) de valor sugestivo: «manhã muito fresca, toda azul e branca»; «lindo sol»; «barras alegres de claridade dourada», evidenciando a preocupação do narrador em passar ao leitor o ambiente, a luminosidade, as cores, o movimento do quadro representado. Ao procurar recriar de forma tão rica o universo representado, recorrendo ao pormenor, o visualismo sobressai;
— a sinestesia, presente em «manhã muito fresca, toda azul e branca», «lindo sol que não aquecia», «varria-se devagar», «no ar macio», «morria à distância um toque fino de missa», sugerindo várias sensações ao leitor: a frescura agradável do ambiente (táctil) associada às cores (visual) e ao sol, a cadência ritmada do varrer e o som distante do sino (auditiva);
— a hipálage em «e punha nas ruas, nas fachadas das casas, barras alegres de claridade» uma vez que aqui é valorizada «a impressão pura, a percepção imediata, tirando o maior partido da cor e da luminosidade» (Dicionário de Termos Literários), evidenciando não «o objecto em si, mas o efeito que provoca no observador» (idem). Este é um dos exemplos da transposição de qualidades tipicamente queirosiana;
— a sinédoque