educação popular livro brandão
Carlos Rodrigues Brandão
“Na verdade se dizer a palavra é transformar o mundo...”
Paulo Freire
Amadurecido ao longo de muitos meses, este livro foi afinal escrito a mão durante os dias de uma viagem em agosto/setembro de 1983 para dois encontros sobre educação popular, um em Cuba e outro na Nicarágua. Algumas anotações foram revistas depois do que vivi, principalmente nos dias da Nicarágua. Quero dedicá-lo aos educadores de lá e espero que isto seja um modo de estar presente.
DIZER A PALAVRA
A palavra
Que a ninguém espante um pequeno livro sobre educação popular introduzir na epígrafe e nas folhas de apresentação a questão da palavra. Afinal, que outra é a matéria do educador senão a palavra? Afinal, que outro é o desafio da educação popular senão o de reverter, no mistério do saber coletivo, o sentido da palavra e o seu poder? Deixemo-la ser aqui, portanto, o começo e o fim do pensar.
Falando sobre o lugar do chefe na sociedade tribal, Pierre Clastres, um antropólogo francês, discute a relação entre a palavra e o poder. Porque a palavra é um ato de poder, o que equivale afirmar que ela não é apenas um entre os seus outros símbolos, mas o seu exercício.
O direito de falar ser ouvido é o ofício do senhor. Os súditos calam ou repetem a palavra que ouvem, fazendo seu o mundo do outro. Porque a diferença entre um e outros está em que o primeiro detém a posse do direito de pronunciar o sentido do mundo e, por isso, o direito de ditar a ordem do mundo social. Ele é quem transformou um dever coletivo e anterior de dizer, no poder de ditar e ser, assim, obedecido; enquanto os outros não tendo sido expulsos do ato de falar — todos falam, em toda parte — existem à margem do lugar onde se fala aquilo que transforma o mundo. Quem disse que sempre a fala do justo é justamente a palavra necessária? Verdadeira, quem garante que por isso mesmo ela seja legítima? Perguntas que nos devem acompanhar, leitor, durante