direito
Filipe Marchioro Pfützenreuter1
Mestre em Teoria Literária - UFSC
Nada poderíamos esperar de diferente de um escritor que, assumidamente, detinha preferência por um tipo de leitor: o leitor ruminante, segundo conceito por ele próprio criado. Para o maior representante da literatura brasileira, esta espécie diz respeito àquele que não se limita ao superficialismo do enredo e que, pelo contrário, busca identificar as relações intertextuais criadas a partir da narrativa, goza de bagagem literária para tanto e, sobretudo, detém senso crítico e perspicácia para ler o que não foi dito às claras. O conto O Espelho de Machado de Assis é, perdoem o trocadilho clichê, um prato cheio para o leitor ruminante. Por detrás da história de Jacobina, personagem que, após ter sido nomeado alferes, vivencia um conflito existencial quando apartado do convívio social em função de um isolamento temporário no sítio da tia, questões de ordem sociológicas e culturais são colocadas em pauta. Se na cidade, por ocasião de seu cargo público, Jacobina passa a ser admirado e bajulado por todos; em confinamento no sítio, cercado apenas por animais, ele se vê novamente como um homem primitivo, desprovido de qualquer poder ou status decorrente da inerente hierarquia existente na sociedade humana. Assim, quando se olha no espelho depositado carinhosamente pela tia em seu quarto, o protagonista do conto observa seu reflexo se decompor gradativamente. O alferes - sua identidade social -passa, então, a dar lugar tão somente ao Jacobina enquanto indivíduo. A situação é desesperadora para ele, revelando, assim, a necessidade humana de convívio social e manutenção do ego. O espelho em torno do qual a cena se desenvolve traz à tona o segundo grande tema abordado por Machado no conto: trata-se de uma discussão sobre a identidade cultural brasileira. O objeto fora trazido junto da corte de D. João VI e era consideravelmente