Democracia Discursiva
Contribuições e Dilemas da Abordagem Deliberativa do Grupo Australiano
Ricardo Fabrino Mendonça*
Os anos 1990 foram marcados por uma guinada na teoria democrática com o fortalecimento do modelo deliberacionista. Tal modelo baseia-se na premissa de que a troca pública de argumentos envolvendo os sujeitos potencialmente afetados por uma questão é o melhor caminho para a produção de soluções políticas. Dentre os principais benefícios atribuídos à deliberação, ressaltam-se o revigoramento da noção de legitimidade1 e a elaboração de decisões mais complexas2.
Trabalhado por um grande número de pesquisadores, o modelo tem impulsionado uma rica e diversificada agenda de pesquisa. Se há alguns princípios que alicerçam o modelo (como mutualidade, publicidade, igualdade e racionalidade), a forma como esses princípios são interpretados varia muito, fazendo-se importante perceber a existência de muitas controvérsias no seio da corrente.
Não se trata, pois, de uma teoria unificada, mas de uma família de abordagens, muitas vezes contraditórias3.
Há concepções muito diferentes sobre os tipos de comunicação válidos em uma deliberação; os objetivos dessa prática; e as esferas em que ela toma lugar (Thompson,
2008). Para que se tenha uma ideia das divergências que constituem a corrente, basta
lembrar a diversidade de fontes a que recorrem os chamados deliberacionistas: Aristóteles, Burke, Sieyès, Stuart Mill, Kant, Rousseau, Dewey, Arendt, Habermas e Rawls, para citar alguns. Tal ecletismo se torna ainda mais evidente com a virada empírica dos estudos deliberativos, nos anos 2000, quando investigações passam a operacionalizar conceitos muito diversos de deliberação.
Tendo em vista essa multiplicidade de abordagens, o presente artigo se propõe a discutir uma delas: a perspectiva da democracia discursiva. Delineada por John Stanley Dryzek, nos anos 1990, a abordagem enfatiza a deliberação como um encontro difuso de discursos, ultrapassando visões
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