DADIVA E MANA
A Polinésia interessa especialmente a Mauss por causa da noção de mana, através da qual inicia seu estudo sobre a obrigação de retribuir. A noção de mana é também importante em partes da
Melanésia, mas em um contexto de menor desenvolvimento da chefia como instância centralizadora da vida social. Essa noção permitiria comparações não só entre essas regiões próximas, mas também entre outras sem uma história de contatos: o potlatch da costa noroesta americana apresentaria noções semelhantes, implicando honra, prestígio e autoridade; não retribuir implica perda do mana.
Mauss inicia a análise da Polinésia por Samoa, salientando a presença de uma classificação de bens e pessoas em: tonga (feminino) : oloa (masculino) : : inalienável
: alienável : : autóctone : estrangeiro.
Essa relação entre gênero e inalienabilidade foi posteriormente estudada por A. Weiner (1976,
1992). Não só objetos mas também conhecimentos rituais são classificados como tonga; são as esteiras de casamento, herdadas pelas filhas, mas também os tesouros, talismãs, brasões, tradições, cultos e rituais. Eles pouco circulam. Proibições impedem-nos de serem repassados a qualquer um; ligam-se assim ao poder, daí serem bens de prestígio, freqüentemente marcas da chefia, carregados de mana.
Analisando as noções nativas de mana e de hau, Mauss conclui que “o que, no presente recebido e trocado, cria uma obrigação, é o fato de que a coisa recebida não é inerte”. Nesse sistema,
“o doador tem uma ascendência sobre o beneficiário”
(Mauss, 1974, p. 54). A transmissão cria um vínculo jurídico, moral, político, econômico, religioso e espiritual, um “vínculo de almas.
Presentear alguma coisa a alguém é presentear alguma coisa de si” (idem, p. 56). Tanto a quantidade e a qualidade do que é trocado tem importância no estabelecimento da superioridade política e moral como também a iniciativa do oferecimento de uma primeira dádiva que irá estabelecer a relação. Há