Crise Cafeeira Celso Furtado
O último decênio do século XIX criou-se uma situação excepcionalmente favorável à expansão da cultura do café no Brasil. Por um lado, a oferta não-brasileira atravessou uma etapa de dificuldades, sendo a produção asiática grandemente prejudicada por enfermidades, que praticamente destruíram os cafezais da ilha de Ceilão. Por outro lado, com a descentralização republicana o problema da imigração passou às mãos dos estados, sendo abordado de forma muito mais ampla pelo governo do Estado de São Paulo, vale dizer, pela própria classe dos fazendeiros de café. Finalmente, o efeito estimulante da grande inflação de crédito desse período beneficiou duplamente a classe de cafeicultores: proporcionou o crédito necessário para financiar a abertura de novas terras e elevou os preços do produto em moeda nacional com a depreciação cambial. A produção brasileira, que havia aumentado de 3,7 milhões de sacas (de
60 kg) em 1880-81 para 5,5 em 1890-91, alcançaria em 1901-02 16,3 milhões149.
A elasticidade da oferta de mão-de-obra e a abundância de terras, que caracterizavam os países produtores de café, constituíam clara indicação de que os preços desse artigo tenderiam a baixar a longo prazo, sob a ação persistente das inversões em estradas de ferro, portos e meios de transporte marítimo que se iam avolumando no último quartel do século passado. Percebe-se melhor a natureza desse problema observando-o de uma perspectiva mais ampla. Os empresários das economias exportadoras de matérias-primas, ao realizarem suas inversões, tinham de escolher dentre um número limitado de produtos requeridos pelo mercado internacional. No caso do Brasil, o produto que apresentava maior vantagem relativa era o café. Enquanto o preço desse artigo não baixasse a ponto de que aquela vantagem desaparecesse, os capitais formados no país continuariam acorrendo para a cultura do mesmo. Portanto, era inevitável que a oferta de café tendesse a crescer, não em