corpo como capital
Julho / Dezembro 2006
O CORPO COMO CAPITAL: PARA COMPREENDER A CULTURA
BRASILEIRA
THE BODY AS A CAPITAL: TO UNDERSTAND BRAZILIAN CULTURE
Mirian Goldenberg 1
Já na década de 1980, o antropólogo Gilberto Freyre, como sempre de forma pioneira e polêmica, buscou pensar o corpo da mulher brasileira e suas transformações.
No livro “Modos de Homem, modas de mulher” (1987), Freyre afirmava que:
Pode-se dizer da mulher que tende a ser, quanto a modas para seus vestidos, seus sapatos, seus penteados, um tanto maria-vai-com-as-outras. Portanto, a corresponder ao que a moda tem de uniformizante. Mas é da argúcia feminina a iniciativa de reagir contra essa uniformização absoluta, de acordo com características pessoais que não se ajustem a imposições de uma moda disto ou daquilo. Neste particular, é preciso reconhecer-se, na brasileira morena, o direito de repudiar modas norte-européias destinadas a mulheres louras e alvas. (p.33).
Gilberto Freyre apontava como modelo de beleza da brasileira a atriz Sônia
Braga: baixa, pele morena, cabelos negros, longos e crespos, cintura fina, bunda
(“ancas” 2 ) grande, peitos pequenos. Dizia, com certo tom de crítica, que esse modelo de corpo e beleza brasileiros estavam sofrendo um “impacto norte-europeizante ou albinizante”, ou ainda “ianque”, com o sucesso de belas mulheres como Vera Fischer:
1
Doutora em Antropologia Social. Professora do Programa de Pós-Graduação em Sociologia e
Antropologia do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro
(IFCS-UFRJ). Autora, entre outros, de De perto ninguém é normal, Nu e Vestido, Os Novos Desejos,
Toda mulher é meio Leila Diniz, A Outra e A arte de pesquisar (todos pela editora Record)
2
Gilberto Freyre elogiava as “encantadoras ancas femininas” que possuíam, na cultura brasileira, significados não apenas estéticos, mas, também, enobrecedores das mulheres portadoras de tais formas.
“Dignas”, “virtuosas”