Carnaval Rio Antigo
Berço do samba e do carnaval, a Praça Onze abrigou negros e judeus no Rio de Janeiro
Beatriz Coelho Silva O carnaval na Praça Onze, numa gravura de Alfredo Herculano. Era nesta área central da cidade que as primeiras escolas de samba desfilaram até os anos 1930.
Nas quatro primeiras décadas do século XX, negros vindos da Bahia e da região cafeeira do Estado do Rio e judeus do Leste Europeu dividiam ruas, escolas e até casas no bairro Praça Onze, que abrangia dezenas de ruas do Centro do Rio de Janeiro. Os dois grupos tinham muito em comum: um passado recente traumático – escravidão para os negros e perseguições religiosas para os judeus – e religiões malvistas pela sociedade. Sem profissões definidas, eles tentaram se adaptar à nova terra trabalhando nas ruas, vendendo mercadorias, produzindo boa música, boa comida, e exibindo um humor refinado. Para negros e judeus, a Praça Onze era ponto de referência, mas os dois grupos a ocupavam de maneiras distintas. Enquanto os negros mantinham instituições informais, sem sedes ou estatutos, os judeus criavam jornais, clubes, sinagogas e escolas. Sua vocação para a política formal e, muitas vezes, de oposição, era explícita, a se julgar pela quantidade de membros da comunidade filiados a correntes políticas brasileiras ou europeias. Os negros, embora organizados na festa, na religião e na solidariedade, não quiseram ou não puderam integrar partidos ou criá-los. Em 1942, o bairro foi demolido para que a Avenida Presidente Vargas pudesse passar, mas entrou para a mitologia carioca como o berço das manifestações mais brasileiras: o samba, o choro, o carnaval. Muito se fala da Praça Onze em sambas clássicos e textos acadêmicos. Negros e judeus contam sua história, mas uns não falam dos outros quando reconstituem esse passado. “Como se um grupo fosse invisível para o outro”, comenta o escritor Sérgio Cabral. No entanto, há fotografias de judeus nos blocos de carnaval e relatos de negros fluentes em