bIPOLARIDADE
Para Esther Earl
Enquanto a maré banhava a areia da praia, o Homem das
Tulipas Holandês contemplava o oceano:
— Juntadora treplicadora envenenadora ocultadora reveladora. Repare nela, subindo e descendo, levando tudo consigo. — O que é? — Anna perguntou.
— A água — respondeu o holandês. — Bem, e as horas.
PETER VAN HOUTEN, Uma aflição imperial
NOTA DO AUTOR
Esta é menos uma nota e mais um lembrete do autor sobre o que apareceu impresso em letras pequenas algumas páginas atrás: Este livro é uma obra de ficção. Eu o inventei. Nem os textos nem os leitores se beneficiam de tentativas de descobrir se há fatos reais por trás de uma história fictícia. Tais esforços são um ataque direto à crença de que histórias inventadas podem ser relevantes, o que é mais ou menos a crença fundamental da nossa espécie. Agradeço a sua colaboração neste quesito.
CAPÍTULO UM
F
altando pouco para eu completar meu décimo sétimo ano de vida minha mãe resolveu que eu estava deprimida, provavelmente porque quase nunca saía de casa, passava horas na cama, lia o mesmo livro várias vezes, raramente comia e dedicava grande parte do meu abundante tempo livre pensando na morte.
Sempre que você lê um folheto, uma página da Internet ou sei lá o que mais sobre câncer, a depressão aparece na lista dos efeitos colaterais.
Só que, na verdade, ela não é um efeito colateral do câncer. É um efeito colateral de se estar morrendo. (O câncer também é um efeito colateral de se estar morrendo. Quase tudo é, na verdade.) Mas a mamãe achava que eu precisava de tratamento, então me levou ao meu médico comum, o Jim, que concordou que eu, de fato, estava nadando numa depressão paralisante e totalmente clínica e, portanto, ele ia trocar meus remédios e, além disso, eu teria que frequentar um Grupo de Apoio uma vez por semana. O grupo era formado por um elenco rotativo de pessoas com várias questões psicológicas desencadeadas pelos tumores. A