biotecnologia e eugenia
A BIOTECNOLOGIA
COMO EUGENIA LIBERAL
O FUTURO DA NATUREZA HUMANA, de Jürgen Habermas. São Paulo: Martins Fontes, 2004, 160 pp.
JOSÉ MAURÍCIO DOMINGUES*
[*] Agradeço a Marcos Nobre os comentários, sugestões e sobretudo as divergências quanto ao conteúdo deste texto.
Cada livro de Habermas contém uma promessa de análise sistemática, amplitude e profusas intuições. O futuro da natureza humana, originalmente publicado em 2001 na Alemanha, não constitui exceção.
Embora a biotecnologia esteja se tornando um questão cada vez mais central para a filosofia e as ciências sociais, o nível do debate por ora não é muito estimulante. Mais uma vez Habermas supera as contribuições médias, propondo instrumentos criativos e fortes perspectivas normativas. A linha de argumento dos ensaios que compõem o livro é filosófica, mas também evidencia importantes implicações sociológicas.
Habermas se mostra claramente preocupado com os recentes desenvolvimentos da biotecnologia, em particular no que diz respeito a um movimento que toca uma ferida da Alemanha democrática e humanista: a possibilidade de políticas eugênicas. Ele assume a impossibilidade, por ora ao menos, de uma eugenia "autoritária", que estaria mais próxima do terrível passado nazista, mas é implacável diante das ameaças postas pela eugenia "liberal" e seus possíveis aspectos elitistas e darwinistas, sobretudo em meio a um clima neoliberal. Uma perspectiva sociologicamente informada não pode duvidar da pulsão orientada para o uso terapêutico em tais tecnologias, como o demonstra a história da medicina (pp. 35-36), de modo que a
"moralização da natureza humana" não é um projeto fácil. Ademais, a fronteira entre terapia e eugenia é difícil de ser definida e Habermas se encontra bastante ciente da possibilidade de uma mudança evolutiva que leve a uma "autotransformação" da espécie humana (p. 30).
Para Habermas, porém, a eugenia liberal não é um resultado inevitável. Podemos pôr barreiras