Artigo De Paulo Lobo Sobre A Constitucionaliza O Do Direito Privado
PAULO LUIZ NETTO LÔBO
Doutor em Direito (USP).
Professor na UFAL e na Pós-Graduação da UFPE.
1. O aparente paradoxo: a constitucionalização do direito civil; 2. Publicização e constitucionalização: uma distinção necessária; 3. As etapas do constitucionalismo e a evolução contemporânea do direito civil. Codificação; 4. Inserção do direito civil no Estado social; 5. Descodificação do direito civil ; 6. Tradição patrimonialista do direito civil e as tendências de repersonalização; 7. Natureza das normas e princípios constitucionais, relacionados ao direito civil; 8. Fontes constitucionais do direito de família; 9. Fontes constitucionais da propriedade; 10. Fontes constitucionais do contrato; 11. À guisa de conclusão
1. O aparente paradoxo: a constitucionalização do direito civil
O direito civil, ao longo de sua história no mundo romano-germânico, sempre foi identificado como o locus normativo privilegiado do indivíduo, enquanto tal. Nenhum ramo do direito era mais distante do direito constitucional do que ele. Em contraposição à constituição política, era cogitado como constituição do homem comum, máxime após o processo de codificação liberal.
Sua lenta elaboração vem perpassando a história do direito romano-germânico há mais de dois mil anos, parecendo infenso às mutações sociais, políticas e econômicas, às vezes cruentas, com que conviveu. Parecia que as relações jurídicas interpessoais, particularmente o direito das obrigações, não seriam afetadas pelas vicissitudes históricas, permanecendo válidos os princípios e regras imemoriais, pouco importando que tipo de constituição política fosse adotada.
Os estudos mais recentes dos civilistas têm demonstrado a falácia dessa visão estática, atemporal e desideologizada do direito civil. Não se trata, apenas, de estabelecer a necessária interlocução entre os variados saberes jurídicos, com ênfase entre o direito privado e o direito público, concebida como