Análise de “Notas sobre a História Jurídico-Social de Pasárgada” de Boaventura de Sousa Santos
O texto do jurista português Boaventura de Sousa Santos traduz de forma muito precisa a situação das favelas e das periferias brasileiras em meados dos anos 1970. A ausência do Estado e de sua tutela para com os habitantes daquela região acaba por dar surgimento a uma nova estrutura jurídica. Uma verdadeira situação de pluralismo jurídico.
Como bem preleciona o professor brasileiro Marcelo Neves, o pluralismo jurídico surge como contestação da pretensão exclusiva do Estado. Há uma “concomitância de ordens jurídicas no mesmo espaço-tempo e, a partir daí, nega-se a pretensão de ‘onipotência’ do Estado”.
A contínua luta com a polícia, o desinteresse dos advogados e a própria ilegalidade da ocupação, na ótica do Estado, foram fatores determinantes para a criação deste ordenamento alternativo. Ou seja, foi do desencontro entre a lei e o direito, entre os códigos e a justiça, que a sociedade de Pasárgada (como é chamada a vila por Santos) instituiu a sua própria estrutura jurídica, à margem do direito brasileiro.
A existência de estruturas jurídicas paralelas ao direito oficial do Estado é, de fato, uma realidade que não atinge somente as favelas brasileiras, está presente em diversos ordenamentos, o homem por natureza procura resolver seus conflitos entre si, reservando a provocação do Estado para último caso.
Porém, devido ao problema habitacional e a discussão de sua legalidade, a comunidade de Pasárgada afastou totalmente a tutela do Estado, temendo a exposição e a publicidade de sua situação jurídica. Desta forma, todo e qualquer conflito, inclusive os de natureza pessoal, ficou privado de ser levado à apreciação jurídica oficial do Estado, de modo que criou uma insegurança jurídica e levou a comunidade para um estado de miscelânea social.
Logo, a estrutura desenvolvida pelos moradores de Pasárgada compromete a definição de direito como sistema