Anne rice
2
Sou o Vampiro Lestat. Lembram-se de mim? O vampiro que se tornou um
superastro do rock, aquele que escreveu a auto-biografia? Aquele de cabelos louros e
olhos cinzentos, e o desejo insaciável de notoriedade e fama? Vocês se lembram. Eu
queria ser um símbolo do mal num século brilhante que não tinha espaço para o mal
literal que eu sou. Achei até que faria algum bem dessa maneira — bancando o demônio no palco pintado.
E estava começando muito bem, quando nos falamos pela ultima vez. Eu acabava
de fazer minha estréia em São Francisco — primeiro “show ao vivo” meu e da minha
banda mortal. Nosso disco foi um sucesso tremendo. Minha auto-biografia estava indo
muito bem, tanto com os mortos quanta com os não-mortos. Então aconteceu uma coisa
inteiramente imprevista. Bom, pelo menos eu não previ. E quando deixei vocês eu estava,
pode-se dizer, a beira do abismo. Bom, agora está tudo acabado — tudo o que aconteceu
depois. Sobrevivi, obviamente. Senão não estaria falando com vocês. E a poeira cósmica
finalmente assentou; e o pequeno rasgão no tecido das crenças racionais foi consertado, ou pelo menos fechado.
Estou um pouco mais triste por causa disso tudo, um pouco mais perverso, e
também um pouco mais cuidadoso. Estou também infinitamente mais poderoso, embora
a minha parte humana esteja mais perto da superfície do que nunca — um ser angustiado
e faminto que ao mesmo tempo ama e odeia essa invencível casca imortal que me
aprisiona. A sede de sangue? Insaciável, embora fisicamente eu precise menos que nunca
— acho que agora poderia viver inteiramente sem sangue. Mas o desejo que sinto por
tudo que anda me diz que nunca farei essa experiência.
Sabem, de qualquer maneira nunca se tratou simplesmente de uma necessidade
ANNE RICE A RAINHA DOS CONDENADOS
de sangue, embora o sangue seja o mais sensual que uma criatura possa desejar; e a
intimidade do momento — matar, beber — a grande dança dos corpos