aguas no tempo
UM MERGULHO “NAS ÁGUAS DO TEMPO”, DE MIA COUTO
Ana Cláudia da Silva*
RESUMO:
No conjunto das obras de Mia Couto, observamos que a temática do tempo é recorrente. Neste estudo, apresentamos o modo como ela se desenvolve, a partir de um de seus contos mais paradigmáticos, intitulado
“Nas águas do tempo”. Nele, o narrador recebe a incumbência de dar continuidade à comunicação entre os vivos e os mortos, cuja perpetuação era, para aquela comunidade, garantia de paz.
PALAVRAS-CHAVE: Literaturas africanas de língua portuguesa; Literatura moçambicana; Mia Couto;
Tempo.
Introdução
O presente estudo tem como objetivo principal a análise do conto “Nas águas do tempo”, de Mia Couto (1996), abordando especificamente a tematização do tempo e a relação deste com a constituição do narrador. Para isso, abordamos o tema do tempo em algumas obras de Mia Couto, a fim de demonstrar como o tempo, enquanto tema, tem sido uma presença constante em sua obra. Em seguida, observamos como o narrador se constitui em relação a esse tempo narrativo, e como o autor, ao elevar a experiência à condição de narrativa literária, colabora com a missão dada à sua personagem, de preservar alguns valores das culturas de matriz banta.
Doutora em Estudos Literários (UNESP). Professora do Mestrado em Letras - Linguagem, Cultura, Discurso.
Universidade Vale do Rio Verde.
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Fólio – Revista de Letras
Vitória da Conquista
v. 3, n. 2
p. 53-64
jul./dez. 2011
Ana Cláudia da Silva
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1. A temática do tempo nas narrativas de Mia Couto
O tempo, nas narrativas de Mia Couto, tem um lugar privilegiado, não apenas como estruturador das narrativas, mas também como tema. Em um dos capítulos de seu romance Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra, por exemplo, encontramos a seguinte epígrafe: “O bom do caminho é haver volta. Para ida sem vinda, basta o tempo”
(COUTO, 2003, p. 123). A insistência em