Aborto
- uma ousadia de profissionais de saúde e gestores -
Cumprir as determinações do Sistema Único de Saúde, visando garantir a igualdade de acesso das mulheres a direitos legalmente, ainda é considerado uma ousadia.
Ousados são os profissionais de saúde que pretendem oferecer um atendimento digno a uma mulher que aborta e, mais ainda, aqueles que ousam atender a demanda das mulheres estupradas que insistem em recusar a gravidez fruto de uma violência.
O aborto, assunto polêmico, discutido muito freqüentemente sob a ótica dos valores, da moral e da religião é, a meu ver, pouco discutido a partir de uma ótica humanística, mesmo quando se trata de uma gravidez decorrente do estupro, fato internacionalmente reconhecido como violação dos direitos sexuais e reprodutivos, e, portanto, dos direitos humanos.
Caracterizados como crime, muitos abortos são feitos na clandestinidade, por pessoas despreparadas tecnicamente e em precárias condições de higiene. Essa é uma condição que aumenta o risco da morbimortalidade materna e revela mais uma vez a desigualdade existente em nosso país, pois sabemos que nos paises onde o aborto é permitido, ele é realizado em serviços públicos, a legalização não eleva o número de procedimentos e a mortalidade materna por esta causa tende a zero.
Ao tratar o aborto como crime, a sociedade nega a inúmeras mulheres brasileiras a possibilidade de terem acesso ao aborto legal. O direito de interromper a gravidez pós-estupro, o direito de interromper a gravidez para preservar a sua vida, e mesmo o direito de, em circunstâncias especiais, abortar para não levar adiante uma gestação de um feto incapaz de viver fora do seu corpo.
O desconhecimento das leis no âmbito dos serviços de saúde contribui para que, até hoje, um grande número de médicos ainda tenha medo de serem levados a julgamento, de serem cúmplices de um crime. Esses argumentos embasam freqüentemente a recusa médica em atender uma mulher que